Títulos hierárquicos no Batuque do RS

Eu sempre digo que sou conservador no Batuque. Isto significa que concordo com novas interpretações, mas não com a alteração dos ritos. Os ritos do Batuque foram instituídos por nossos ancestrais e devemos honrá-los. Contudo, defendo o uso de alguns títulos no Batuque que são típicos do Candomblé como Abíyán, Ìyàwó e Ẹ̀gbọ́nmí. Alguns criticam isso porque seria candomblenizar o Batuque. Outros que seria uma apropriação indevida.

Eu acredito que não há problema algum, assim como não houve quando passamos a utilizar os termos Bàbálórìṣà e Ìyálórìṣà que também foram criados pelo Candomblé. Em África estes títulos não existem. O termo típico do Batuque para o sacerdócio, pelo menos até meados dos anos 1980, era Babaláu e Babalôa, certamente corruptelas de Bàbáláwo, o sacerdote de Ifá-Ọ̀rúnmìlà. Foi com a popularização do Candomblé na grande mídia no centenário da abolição da escravatura em 1988 que os termos Bàbálórìṣà e Ìyálórìṣà começaram a aparecer por estas bandas gaudérias.

Como as Tradições de Matriz Africana possuem uma Teologia e Filosofia em comum, ou seja, a essência do Candomblé e do Batuque é a mesma, as diferenças estão apenas no formato, na casca (por isso acredito que é a falta de compreensão disto que leva iniciados no Batuque a praticar também o Candomblé, o que é bastante incoerente; seria o mesmo que uma pessoa dizer que é católica e luterana ao mesmo tempo, por exemplo) e mesmo aí há semelhanças: Candomblé faz Borí, faz Òrìṣà e entrega Deká; o Batuque faz Borí, faz Òrìṣà e entrega Axés (Àṣẹ). Onde está a diferença? Apenas nos ritos, mas não nos propósitos.

Por isso penso ser conveniente adotar alguns títulos:
- Abíyán: é o recém nascido para a comunidade. Pessoas que passaram pelo rito de Omièrọ, Oríbíbọ ou Borí (aves, meio-quatro-pés ou de quatro-pés);

-.Ìyàwó: é o iniciado para um Òrìṣà ou mais. No Batuque costumamos chamar de Pronto ou Pronto de Cabeça. É aquele que tem alguns Òrìṣà sentos.

- Ẹ̀gbọ́nmí: é o Pronto com Axés.

Bàbálórìṣà e Ìyálórìṣà são títulos que se dá àqueles que tem casa aberta, ou seja, que são líderes de uma Comunidade Tradicional de Matriz Africana. Já aqueles que apenas tem seus Òrìṣà em casa talvez o título mais adequado seja Olòrìṣà, Zelador de Òrìṣà.

Comentários

Akọni Àjasé disse…
Olá professor Hendrix, também partilho a mesma ideia.
Obviamente, algumas apropriações do Candomblé, por exemplo, o toque do agogô em todas as rezas são explicitamente, na minha opinião, uma tentativa de imitar o Candomblé, mas especificamente neste caso dos títulos hierárquicos, acredito que não seja nada de todo mal adota-los, afinal a designação de cada título, seja aqui ou lá, são os mesmos. Axé
Olá Akọni Àjasé.
Obrigado pelo seu comentário.
O toque do agogô é legítimo do Batuque, mas pertencia somente à Tradição Jeje que toca com aguidavi. Hoje é quase inexistente o toque com aguidavi no Batuque, mesmo o Jeje, mas o agogô tem sido usado em outras Nações quando se toca o ritma chamado de jeje.
Mas em termos de instrumento musical a apropriação mais visível é o uso do adjá.
Um abraço

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